sexta-feira, agosto 25, 2006

1157 – Para o Paulinho no dia do seu falecimento

Deitado dormes o sono eterno
Arrefecendo o teu corpo na morgue fria,
Jazes sem pressa nem novo dia,
Nesse anúncio do teu tumular Inverno.

E quando a terra te levar, um materno
Beijo desprender-se-á sem alegria,
Lembrando uma saudade que fantasia
No teu coração quieto no externo.

Na perfeição do teu ataúde entalhado,
Recolherás cedo à etérea casa forte,
E aí ficarás nesse mundo alado.

E todos choraremos por teres corrido
Com o teu jeito alegre e descontraído,
Depressa demais para a tua morte.

segunda-feira, agosto 21, 2006

1155 – Última morada

Este que sou e te dou sem mais nem menos
Ao teu uso, ao gasto em tuas mãos tão nossas,
Em carícias vãs e vãos acenos
Nas noites frias, escuras e grossas,

Sabe que és, fruto destes ímpetos serenos,
A última morada que procuro, e possas
Assim, nos teus braços pequenos,
Embalar-me num sono fundo e sem mossas.

Que o teu corpo achado na noite oculta,
Se transforme no meu berço perdido,
E o túmulo da minha carne insepulta.

Deixa-me e usa-me tal como a ti me dou,
Ao abandono deste viver sem sentido,
Por só estar comigo quando contigo estou.
1150 – Vento por detrás da porta

Ouço-te e és o vento por detrás da porta,
Misteriosa e sensual no teu alcance,
Adivinho-te dançando até que se canse
O teu corpo nacarado. E não me importa

Esperar-te um pouco nesta hora morta,
Para que meu corpo urgente se amanse
No teu após a dança, e ébrio descanse,
Do que me dás e me tiras da aorta.

Contorcidos, um pelo outro subindo,
Já nos sinto, avançando, aliados,
Frondosas heras no sangue se diluindo.

Assim te espero silhueta, sombra esguia,
Os nossos corpos unidos, reconciliados,
A noite inteira até ao nascer o dia.